HAVIA...
Havia um sol desanimado entre nuvens que
numa dança voluptuosamente estranha
ameaçavam gotejar...
Havia um céu riscado de asas sobre os telhados
que escondiam mistérios encapotados
de almas geladas,
quase horizontais, solfejando seus ais...
Havia tantas janelas cerradas,
qual dentes trincados amordaçando desejos, agonias,
vitrines de flores enfeitadas...
Havia vultos recitando promessas contritas
na esperança da barganha, sorrindo à porta do templo.
Patético exemplo...
Havia um vento frio, cortante, emudecedor,
contaminando por onde passava com gélido torpor...
Havia crianças...
Havia?
Não sei, delas só sei que não se ouvia...
Havia aqueles sinuosos gatos vadios
que olhavam atentamente o nada
camuflando com suposta indiferença os seus cios...
Havia uma preguiça coletiva
exposta nas esquinas mortas
onde sequer um bêbado se via sobre as pernas tortas...
Havia uma saudade extrema e drástica,
olhos d´água carpindo tudo e nada...
Rostos pétreos em corpos rígidos, cena fantástica!
Havia aquela angustiante sensação de calma
que antecede as tragédias, embala os mortos
e contém os corpos...
Havia aquele desespero de toda urgência,
um sufocante palpitar mal dedilhado,
dissonante sinfonia executada com premência...
Havia vida, é verdade, havia...
entre paredes, dentro do peito, em torniquetes,
naquela gaivota alheia, liberta e toda branca...
Havia vida, havia...
mas ninguém via...
Sylvia Cohin
Havia um sol desanimado entre nuvens que
numa dança voluptuosamente estranha
ameaçavam gotejar...
Havia um céu riscado de asas sobre os telhados
que escondiam mistérios encapotados
de almas geladas,
quase horizontais, solfejando seus ais...
Havia tantas janelas cerradas,
qual dentes trincados amordaçando desejos, agonias,
vitrines de flores enfeitadas...
Havia vultos recitando promessas contritas
na esperança da barganha, sorrindo à porta do templo.
Patético exemplo...
Havia um vento frio, cortante, emudecedor,
contaminando por onde passava com gélido torpor...
Havia crianças...
Havia?
Não sei, delas só sei que não se ouvia...
Havia aqueles sinuosos gatos vadios
que olhavam atentamente o nada
camuflando com suposta indiferença os seus cios...
Havia uma preguiça coletiva
exposta nas esquinas mortas
onde sequer um bêbado se via sobre as pernas tortas...
Havia uma saudade extrema e drástica,
olhos d´água carpindo tudo e nada...
Rostos pétreos em corpos rígidos, cena fantástica!
Havia aquela angustiante sensação de calma
que antecede as tragédias, embala os mortos
e contém os corpos...
Havia aquele desespero de toda urgência,
um sufocante palpitar mal dedilhado,
dissonante sinfonia executada com premência...
Havia vida, é verdade, havia...
entre paredes, dentro do peito, em torniquetes,
naquela gaivota alheia, liberta e toda branca...
Havia vida, havia...
mas ninguém via...
Sylvia Cohin
Porto, 19.03.2006
10 Comments:
Às vezes escreve-se... escreve-se... e quando menos esperamos surge a «OBRA-PRIMA».
è difícil escrever melhor.
FP
.... falou e disse o amigo Fernando.... Sylvia, vc está maravilhosa.... bjs do seu amigo
Ah Syl o Fernando Peixoto roubou-me a expressão já preparada para escrever aqui- OBRA PRIMA - porque HAVIA VIDA , HAVIA
MAS NINGUÈM VIA...
Exemplar literário de qualidade ! A poeta , minha preferida ,sabe o que diz , e por isso o faz da melhor forma , até a mais profunda raiz !
parabéns amiga!
Suas poesias são jóias da literatura lírica !
Beijos e saudades
Vera Mussi
Mana, agradeço a Deus por me permitir conhecer você e suas letras. Que primasia!
Parabéns
Beijos
Syl,
Eu estou verdadeiramente encantada!
Olha, já conheço muito de sua obra e tenho aplaudido sempre, porque considero-a da maior e melhor qualidade. Não sou crítica literária, vc sabe disso, mas tenho um ouvido e um sentimento muito apurado. Então sinto mais do que compreendo. rsrsrs
Este "Havia", no meu entendimeto, foi o de melhor que já li seu até aqui. Não desmerecendo as maravilhas já produzidas. Este me arrepiou, menina baiana/portenha! Lindoooo!!!! que mais posso dizer?
O que mais haveria a dizer? nada!!!! absolutamente, nada!!!!
Este comentário vai ficar aqui na chave da poesia. Porque aqui "Havia" e como havia!!!!!!!!!
Beijos
Emy
"...Havia vida, é verdade, havia...
entre paredes, dentro do peito, em torniquetes,
naquela gaivota alheia, liberta e toda branca...
Havia vida, havia...
mas ninguém via..."
Demorei, mas descobri o Blog da Sylvia Cohin e, li e reli este fantástico Poema... adorei!
Que mais posso dizer, que já não tenha sido dito?
Vou linkar-vos, para não perder o caminho para cá...
Um abraço carinhoso e boa semana para todos ;)
Gostei tanto deste Poema, que não resisti a colocá-lo no meu "refúgio". Algum inconveniente, diz, que o retirarei de imediato.
Um abraço carinhoso ;)
Senti-me em casa neste espaço acolhedor e cheio de poesia.
As imagens são de sua autoria?
Beijinhos.
Em visita ao sítio da Menina Marota me deparei com esse encanto de poema. Não resisti: corri pra cá!
Um abraço fraterno.
...havia sinuosos gatos vadios que olhavam atentamente o nada...
E tu, minha Irmã do outro lado do mar, que olhas atentamente, sinuosamente, para escreveres a tristeza cinzenta que nos invade?!!!
Beijos
Maria Mamede
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